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25 / fevereiro
Em janeiro passado, Vladimir Putin abraçou o seu novo camarada cidadão russo, o ator francês Gerard Depardieu , posando para as câmeras no porto de Sochi, no Mar Negro. “Eu adoro seu país”, disse Depardieu – principalmente sua alíquota única de 13% sobre a renda pessoal.
Sochi pode não ser Saint-Tropez, mas conta com temperaturas brandas no inverno e até mesmo palmeiras. O vice-primeiro-ministro de Putin previu confidencialmente uma “migração em massa dos europeus ricos para a Rússia”.
Nos Estados Unidos, Phil Mickelson, golfista profissional tricampeão do Masters, deixou o 18º buraco do Pebble Beach Golf Links recentemente e afirmou que pode se mudar da Califórnia, pois o Estado aumentou a faixa mais alta do imposto de renda de 10,3% para 13,3%.
“Ei, Phil”, escreveu o governador texano, Rick Perry, no Twitter. “O Texas é a terra da liberdade e dos impostos baixos… Nós iríamos adorar contar com você também!” Tiger Woods disse mais tarde que se mudou da Califórnia para a Flórida justamente por esse motivo anos atrás. Mickelson pode “votar com seu Gulfstream”, observou um editorial do “Wall Street Journal”, referindo-se ao jatinho particular do golfista, alertando a Califórnia a “esperar uma migração contínua”.
OUTROS MOTIVADORES
É um ponto de honra entre os defensores dos impostos baixos que os aumentos de alíquotas voltados unicamente para os ricos servem apenas para afastá-los. Como Stuart Varney, jornalista econômico britânico, disse à rede de televisão “Fox News”: “Vejam o que aconteceu no Reino Unido. Aumentaram a alíquota máxima para 50% e dois terços dos milionários desapareceram no ano fiscal seguinte. A mesma coisa está acontecendo na França. As pessoas estão indo embora quando a alíquota máxima é de 75%. A situação se repetiu em Maryland alguns anos atrás. Decretaram um novo imposto para milionários e estes desapareceram. Vemos ocorrer exatamente isso na Califórnia.”
Isso, ao menos, é o que os defensores dos impostos baixos querem que pensemos, e o argumento parece fazer sentido. Porém, não é nada disso. Acontece que a grande maioria das pessoas se muda por motivos muito mais convincentes, tais como empregos, custo dos imóveis, laços familiares ou clima mais quente. Pelo menos três estudos acadêmicos recentes demonstraram que o número de pessoas que se mudam por causa dos impostos é desprezível, até mesmo entre os ricos.
Cristobal Young, professor assistente de sociologia da Universidade de Stanford, estudou os efeitos do recente aumento de impostos em Nova Jersey e na Califórnia. “Ficou bastante claro que, no total, mudanças modestas na alíquota máxima não afetam a migração dos milionários”, ele disse pouco tempo atrás. “Nem aumentos nem cortes nos impostos sobre os ricos afetaram seu índice de migração.”
A noção de fuga dos impostos “é quase inteiramente tapeação, é um mito”, declarou Jon Shure, diretor de estudos fiscais do Centro de Prioridades Orçamentárias e Políticas, grupo de pesquisa sem fins lucrativos de Washington. “A cobertura jornalística baseada em rumores faz parecer que as pessoas estão partindo em bandos por causa dos impostos altos, mas não estão. Existem vários Estados com impostos baixos, e não se veem milionários se congregando por lá.”
Apesar do fascínio dos baixos impostos, Depardieu não foi visto na Rússia desde que pegou o passaporte e parece estar salvaguardando suas apostas ao manter a cidadania belga. Enquanto isso, os bilionários russos estão abocanhando os imóveis tidos como troféus em Londres, Nova York e Los Angeles, onde os impostos são altos.
“Não escuto falar de muitos bilionários se mudando para Moscou”, disse Robert Tannenwald, professor assistente de economia política da Universidade Brandeis e ex-economista do Banco Central dos Estados Unidos. Ao lado de Nicholas Johnson, ele e Shure são os autores da pesquisa acadêmica “A fuga dos impostos é um mito”, de 2011.
Logicamente, algumas pessoas se mudam por causa da carga fiscal, principalmente aposentados ricos, atletas e celebridades sem ligações fortes com locais onde os impostos são elevados, como empregos e familiares.
OUTROS QUE SE MUDARAM
Ao renunciar à cidadania francesa, Depardieu segue os passos de outras celebridades francesas, como o chef Alain Ducasse, o cantor Johnny Hallyday e Yannick Noah, ex-astro do tênis. Vários gestores de fundos hedge parisienses se mudaram para Londres e o magnata da moda Bernard Arnault solicitou a cidadania belga, embora tenha dito que não foi por causa dos impostos.
Astros como Depardieu e Mickelson certamente têm incentivos para se mudarem. O primeiro reclamou do fato de ter pagado 85% de seus rendimentos em tributos na França no ano passado, acumulando € 145 milhões pagos nos últimos 45 anos. A França tem a alíquota máxima de 41%, além de um imposto sobre a riqueza, e o presidente socialista François Hollande está tentando impor uma sobretaxa temporária de 75% sobre rendas superiores a € 1 milhão . Mickelson ganhou por volta de US$ 60 milhões no ano passado, segundo estimativa da revista “Sports Illustrated”, ou seja, o aumento de três pontos percentuais nos impostos californianos poderia representar mais US$ 1,8 milhão em taxa adicional.
Gregory Mankiw, economista da Universidade Harvard, afirmou que as alíquotas de impostos afetam mesmo a migração, ao menos de determinados grupos. “Os ricos podem viver praticamente em qualquer lugar.”
Para esse grupo abastado e móvel, não importa muito onde fica sua residência oficial. Mickelson e Woods viajam pelo circuito dos torneios de golfe ao longo do ano. As pessoas muito ricas costumam ter várias casas em diversos lugares, até mesmo em outros países, e podem se locomover entre elas para evitar os tributos locais.
Um astro como Depardieu “pode ir a Paris sempre que der na telha”, comentou Shure. Tannenwald concordou: “Quem é muito rico, aposentado ou não está ligado a uma região em particular muda de residência num índice elevado por conta das diferenças nos impostos”.
Porém, não existem muitas pessoas assim. “A fuga motivada pelos impostos é rara”, disse Tannenwald. Ele acrescentou: “Na medida em que as pessoas deixam um Estado ou evitam um destino potencial, elas o fazem principalmente por outros motivos, como encontrar casas a preços mais acessíveis, melhores perspectivas de emprego ou um clima mais atraente.”
Segundo Young, para a maioria das pessoas, até mesmo os muito abastados, não é fácil se mudar, pois as empresas de maior sucesso e os empregos com os maiores salários estão ligados a locais específicos. Além disso, “o empreendedorismo e a rentabilidade estão agrupadas em regiões muito competitivas, como o Vale do Silício, Los Angeles e a cidade de Nova York. Quem ganha mais de US$ 1 milhão costuma estar próximo dos anos de renda máxima, e está aproveitando os frutos dos investimentos de longo prazo na carreira. É difícil se afastar disso”.
Sua pesquisa em Nova Jersey descobriu que, embora algumas pessoas tenham partido, qualquer perda de receita foi mais do que compensada pela receita acrescentada por quem ficou. Shure acrescentou: “Posso afirmar categoricamente que nenhum Estado aumentou os impostos e perdeu dinheiro”.
Ainda assim, o mito da fuga dos impostos continua muito persistente, espalhado pela cobertura da imprensa sobre as celebridades, que estão entre as pessoas com maior probabilidade de ter meios e motivos para escolher uma residência devido ao imposto.
“Sempre é possível ouvir um rumor”, disse Shure. “Muitas pessoas querem que isso seja verdade como forma de desencorajar os aumentos nos impostos. Os ricos sempre estão tentando encontrar maneiras de levar a classe média a defendê-los.”
Fonte: Economia